O Órgão da igreja de São Vicente de Fora
The Organ of the Church of São Vicente de Fora
O Convento de São Vicente de Fora, casa lisboeta dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, foi fundado por D. Afonso Henriques em 1147. A pedra fundamental do edifício que hoje existe foi lançada em 25 de Agosto de 1582 pelo Cardeal-Duque Alberto, governador de Portugal por Filipe II, concluindo-se as obras de pedreiro no interior do corpo da igreja em 1629 e inaugurando-se nesse ano, em cerimónia solene a 28 de Agosto, a capela-mor. Após o terramoto de 1755, e depois de realizadas as reparações mais urgentes, estabeleceu-se ali a Santa Basílica Patriarcal. Por detrás do altar fica o coro, muito amplo, formando a cabeceira da cruz, em cujo topo, instalado sobre uma imponente tribuna alta, está o órgão que, desde 1994, sabemos construído em 1765 pelo organeiro João Fontanes de Maqueira.
Com a vantagem de se encontrar em estado quase original, trata-se de um dos mais importantes e representativos instrumentos barrocos portugueses, a par dos órgãos da Sé Catedral de Braga, construídos entre 1737 e 1739 pelo organeiro galego Fr. Simón Fontanes, porventura parente do construtor do órgão de São Vicente de Fora.
O instrumento possui duas secções independentes, órgão principal e órgão de eco, a que correspondem dois teclados manuais de 47 teclas (teclado superior – órgão principal teclado inferior – órgão de eco;), na extensão de Dó1 a ré3 com «oitava curta». Dispõe o órgão principal de 38 meios-registos e o órgão de eco 13, encontrando-se quatro destes (Nazardo III, Flautado de 12, Corneta VI e Clarim) encerrados numa caixa de ecos, cuja abertura é comandada por um estribo de ferro. A canaria soante conta 2827 tubos labiais, sendo 65 de madeira, e 282 tubos de palhetaria. Tem além disso um Tambor, dispositivo de seis tubos, quatro em madeira e dois em metal, accionados por dois pedais, que produz um som cavo, semelhante ao instrumento de percussão.
O órgão de São Vicente de Fora sofreu reparações de pouca monta em finais de século XIX, quando o diapasão original do instrumento foi subido; em 1956-1957, pelos organeiros João e José Sampaio, que limparam a canaria e instalaram um fole novo alimentado por um ventilador eléctrico; e, em 1977, de novo pela oficina de João Sampaio & Filhos, que introduziu peças de plástico, pele artificial e colas sintéticas na mecânica e transformou os teclados. Por ocasião da Capital Europeia da Cultura, a Sociedade Promotora de Lisboa ’94 encomendou o completo restauro do órgão a Claudio Rainolter e Christine Vetter, com oficina em Tarazona, Província de Saragoça, os quais, auxiliados por Nicholas Michael Watson e assessorados pelo organista Joaquim Simões da Hora, empreenderam os trabalhos entre Novembro de 1993 e Outubro de 1994, desmontando o órgão por completo e repondo os materiais originais.
Foi na ocasião deste restauro, quando se abriram os someiros e os respectivos secretos, que passámos e conhecer a data de construção do órgão de S. Vicente de Fora e o nome do seu construtor, inscrito no secreto do órgão de eco: «Há feito de novo em o anno de 1765 Joao Fontanes de Maqueira». Este organeiro construiu em 1763 o órgão da capela do Seminário Maior de Coimbra. Numa memória descritiva do restauro do órgão de S. Vicente de Fora, La restauración del organo de São Vicente de Fora 1765-1994, Claudio e Christine Rainolter aventam a hipótese deste instrumento aproveitar alguma canaria de outro órgão menor (designadamente, os actuais Flautados do órgão principal) construído pouco antes do terramoto de 1755 por Fontanes de Maqueira.
João Pedro d’Alvarenga
The Convent of São Vicente de Fora, house of the Augustinian Canons Regular in Lisbon, was founded by D. Afonso Henriques in 1147. The first stone of the present building was laid on August 25 1582 by the Cardinal-Duke Alberto, governor of Portugal in the name of Filipe II. The mason works inside the church were concluded in 1629 and on August 28 of the same year the chancel was inaugurated with a solemn ceremony. In the aftermath of the 1755 earthquake and when all the most urgent repairs were completed, the Patriarchal Church was established there. The large choir is located behind the altar, framing the cross. The organ, placed on a loft at the top of the choir, was built by the João Fontanes de Maqueira in 1765, as it was found out in 1994.
With the advantage of being in almost original condition, this is one of the most important and representative Portuguese baroque instruments, along with the organs of Braga Cathedral, built between 1737 and 1739 by the Galician organ builder Fr. Simon Fontanes, probably a relative of the builder of the organ of São Vicente de Fora.
The instrument has two independent sections: the great organ and the echo organ, to which correspond two manuals (upper manual – great organ; lower manual – echo organ), each of them with 47 keys from C to d’’’ with “short octave”. The great organ has 38 half stops and the echo organ has 13, four of which (Nazardo III, Flautado de 12, Corneta VI and Clarim) are enclosed in a swell box opened though the action of a foot lever. The pipework consists of 2827 flue pipes (of which 65 are made of wood) and 282 reed pipes. Apart from this, it also has a tambor, a set of six pipes (four wooden and two made of metal), operated by two pedals, that produces a hollow sound similar to percussion instrument.
The organ of São Vicente de Fora has suffered minor repairs during the late nineteeth century when the original pitch was raised, in 1956/1957 by the organ builders José and João Sampaio, who cleaned the pipework and installed a new bellow supplied by an electric ventilator and, in 1977, once again by the Sampaio & Sons workshop, when plastic pieces, artificial skins and synthetic glues were introduced and the manuals were transformed. In 1994, when Lisbon was European Capital of Culture, the Sociedade Promotora de Lisboa ’94 commissioned the complete restoration of this organ to Claudio Rainolter and Christine Vetter from Tarazona (Zaragoza, Spain). With the help of Nicholas Michael Watson and the assistance of organist Joaquim Simões da Hora, they performed all the works between November 1993 and October 1994, completely dismounting the instrument and returning to the original materials.
It was during this restoration, when the wind-chests and the pallet boxes were opened, that the date of construction of the S. Vicente de Fora’s organ and the name of its builder, were discovered written in the pallet box of the echo organ: “Há feito de novo em o anno de 1765 Joao Fontanes de Maqueira”. This organ builder has built in 1763 the organ of the chapel of the Seminário Maior in Coimbra. In a descriptive memorandum about the restoring of the S. Vicente de Fora’s organ, La restauracion del órgano de São Vicente de Fora 1765-1994, Claudio Rainolter and Christine Vetter wonder if this instrument could integrate the pipework of another smaller organ namely the present Flautados of the great organ, built shortly before the 1755’s earthquake by Fontanes de Maqueira.
João Pedro d’Alvarenga
Translated by Luísa Taveira
Igreja de São Vicente de Fora, Largo de São Vicente, 1100-572 Lisboa